Catorze.
“Como Eric também se perdeu”
Terá sido assim: “Deviam ser umas oito da noite e eu vinha da praia.
Tinha combinado qualquer coisa com duas miúdas que conheci da parte da manhã na piscina
do hotel e estava atrasado.
Como uns tipos locais me tinham falado de um caminho mais curto através das montanhas, decidi arriscar. Durante quinze minutos atravessei o verde das encostas absolutamente sozinho
sem que um único carro
se cruzasse comigo e comecei a achar que ou me tinha enganado
no caminho ou era alguma
brincadeira dos nativos
com os turistas. Ou mesmo qualquer
coisa pior, qualquer intenção criminosa que se escondia
por detrás da informação que me haviam dado.
Entretanto, a estrada começou a apresentar-se-me em pior estado, piorando a cada quilómetro. A paisagem
não era desagradável. A situação era.” Nós líamos aquilo
atentamente e ninguém se atrevia a interrompê-lo.
“Ao fim de uma hora eu continuava
na montanha e sem perspectivas de sair dali. De
repente, numa curva, apareceu-me, ao longe, uma grande quantidade de luz que não reconheci imediatamente. Andei mais alguns quilómetros, parei o carro e, com a ajuda de binóculos, reconheci tratar-se da cidade onde eu estava hospedado. Calculei que, apesar do tempo que já havia perdido, quinze minutos pôr-me-iam
no lugar que eu queria. Ora, estando as montanhas à minha
esquerda, e a cidade à minha
direita, vendo-me
constantemente a curvar no sentido contrário
a esta, embrenhando-me cada vez mais na serra,
aproveitei, quando me apareceu
uma estrada nova à minha direita, para mudar de direcção.
Durante uns dez minutos rolei entre o pó e a bruma. Continuava
a descortinar as luzes da cidade ao longe mas, por mais atalhos que eu tomasse, não havia maneira de me pôr na estrada principal que me era familiar. Umas duas horas e meia depois,
aconteceu o pior. Gasolina, zero. Saí do carro,
dei três pinotes
e amaldiçoei os tipos que me tinham aconselhado o trajecto.
Eram praticamente onze da noite. Estava cheio de fome, tinha a certeza
de que as miúdas não estavam à minha espera e não fazia ideia de como ia sair daquilo. Encostei-me ao carro e, com uma emissora local
sintonizada, comecei a beber um pacote de leite. Imaginam
o que aconteceu então? Saiu-me
ao caminho um velhote
a cantarolar a mesma
canção do folclore
local que saía da porta do Jeep. ‘Eh lá!’,
interpelou-me ele placidamente, monocórdico. (‘Interpelou’ era um termo típico do Eric.
Tique de advogado.) Puxava uma espécie de carripana com duas rodas atulhada de ferramentas e outras coisas que eu não pude distinguir. ‘Allah hu acbar.’ - foi a
primeira coisa que me saiu entre dentes.
Uma coisa que aprendi com um cliente árabe que não parava de ma repetir
depois de ganharmos uma causa perdida. Qualquer coisa acerca de uma francesa
que ele tinha comprado para o filho.”
Nós continuávamos a ouvi-lo atentamente. Nessa altura, como agora, éramos um
grupo de cinco e encontrávamo-nos umas duas ou três vezes por semana. Além de mim, da Kate e do Eric, havia ainda o Johny Boy, era assim que ele gostava que o
tratássemos, que tanto nos falava de Nova Iorque como de Londres - às vezes vinha
acompanhado de uma rapariga ruiva e alta, modelo,
pelos vistos - e, em Osaka, o Songo-Han. Na altura, foi o único
que notou que alguma coisa
não estava bem. Comigo. Depois, há sempre aqueles que vão e vêm. É com este grupo que eu liber- to
as minhas vergonhas mais inconfessáveis, nem todas. Mas ouçamos o resto da história do Eric.
“Pela explicação do velho, rapidamente percebi que nunca,
por mim, voltaria a encontrar o rumo certo. A estrada
principal, a marginal, estava ali mesmo ao lado,
mas grande parte destes caminhos onde nos encontrávamos eram particulares e conduziam a velhas minas arruinadas e sombrias. Foi isto mesmo que ele me disse. Ele
próprio que era, ainda, o proprietário da única mina em funcionamento. Apenas ele a trabalhava e, dir-se-ia, pelo seu aspecto
e pela forma como transportava o material
de trabalho, que a mina, mais do que a sua felicidade constituía para ele fonte de
miséria e de frustração. Eu não podia estar mais enganado,
como mais tarde constatei. Aquele velho era absolutamente feliz. Feliz. Notem bem, eu digo feliz na inteireza do termo. Estou a dizer-vos, feliz. Algo para nós completamente desconhecido. No extremo da miséria, algures em nenhures,
nas latitudes do fantástico, do essencial,
ele não guardava em si qualquer mágoa pela vida.
Tudo isto, eu fui-o
sabendo enquanto subíamos
um carreiro até à sua casa. Era assim que ele chamava
um barracão pré-fabricado com a fibra de vidro já a mostrar-
se entre as placas retorcidas
pelo Sol e pela chuva. Apenas um candeeiro iluminava a cena quando chegámos
ao pátio onde deixou o carro com as ferramentas.
Acompanhei-o
confiante na promessa de uns litros de gasolina que, aparentemente, eram,
aparte um velho
rádio de pilhas,
os únicos resquícios de civilização que guardava. A gasolina, pelo que me explicou, servia um motor que em tempos utilizara na mina para puxar o vagão. Mas agora apenas se servia da sua própria força e cada pepita era duplamente
compensadora. A promessa
incluía também um percurso
guiado até às raias da civilização. Que eu desconfiava significar coisas opostas
para ambos. Estávamos na cabana, ou como lhe queiram chamar, onde ele tinha a
chave de uma pequena arrecadação onde guardava as ‘alfaias’. Mandou-me entrar e
saiu ‘por la gasolina’. Eu sentei-me numa poltrona velha que me indicou e, durante
breves instantes, examinei a habitação escassamente iluminada
por uma gambiarra. Aquilo era como um estúdio, uma única divisão com a cama a um canto, uma espécie de cozinha a outro e, por fim, o que seria a sala a ocupar dois terços do espaço. Aí
pusera a poltrona
onde eu me sentara, uma mesa e duas cadeiras. Duas cadeiras;
estaria ele à minha
espera? Só mais tarde me apercebi
de um pormenor curioso.
Entretanto, o velhote apareceu na ombreira da porta, com a lata na mão. Já não estava tisnado e trazia roupa lavada.
Um par de minutos
depois tínhamos regressado ao local onde eu deixara o carro. Fizemos
todo o percurso em silêncio.
Quando esvaziei a lata para dentro do depósito
perguntei-lhe quanto lhe devia. Ele riu-se. ‘Por agora,
nada. Talvez um dia.’, respondeu-me. ‘Gostava de ser desprendido como o senhor.’,
disse-lhe. ‘A matéria não é tudo. Não se deixe
apanhar por isso.
Não
faz bem à
saúde.’, tornou-me, com um sorriso fechado; fiz-lhe um sinal afirmativo com a cabeça. Então, inesperadamente, quando
nos preparávamos para partir, perguntou-me se não queria jantar com ele. Disse-lhe que se fazia tarde e que não queria incomodar, mas ele insistiu.
Percebi que não poderia
dizer-lhe que não. Voltámos
à cabana. Assim que entrámos ele sintonizou o rádio. A música era agradável e dava um aspec-
to estranho à cena. O velhote preparava o jantar no outro canto da casa, assobiando descontraidamente a melodia que saía do aparelho,
como se lhe fosse já familiar. Só
então me apercebi do pormenor
estranho de que vos falei há pouco e que me teria escapado completamente se eu estivesse naquele momento a caminho da marginal.
À esquerda de quem entrava,
quase em toda a extensão
da parede, na penumbra, uma biblioteca distribuía-se
pelas prateleiras de um móvel
de pinho escuro.
Eram centenas de livros, se não milhares, aquilo que os meus olhos acabavam de descobrir. Levantei-me. Eram livros
de filosofia, de história, de música, de direito, romances, ensaios, poesia. Até o Corto Maltese lá estava, não sei se conhecem.
O velho voltou-se, viu-me de pé junto ao móvel e sorriu. Não disse nada. Ou disse, sim, disse.
‘Não pude desfazer-me disso.’
Veio depois até ao pé de mim e estivemos em silêncio a ouvir música enquanto o jantar cozia.
O mais surpreendente aconteceu depois.
Dispostos os pratos
e os talheres, o velhote
trouxe a panela para a mesa. Antes de me servir pediu-me
desculpa. Pediu-me desculpa porque apenas tinha batatas cozidas
para me oferecer. Servimo-
nos e
jantámos em silêncio.
Não me perguntem porquê, nunca para mim uma refeição foi assim completa.
“Quando nos despedíamos, já na marginal, eu voltei a agradecer-lhe por tudo,
tomando-lhe ambas
as mãos nas minhas. Ele voltou a desculpar-se pelo jantar e, então, eu senti os olhos húmidos, apertei-lhe mais as mãos entre as minhas e apressei-me para dentro do carro. Ainda hoje sinto o coração
enternecido ao pensar nisto
e apenas me atrevi a contá-lo a vocês.”
Tudo isto nos foi narrado em poucos minutos à velocidade
dos dedos do Eric, deixando-nos sem ar e sem vontade de dizer mais nada. Confesso
que nunca esperaria que tal história
viesse a passar-se
com o Eric. Que, na verdade, não era história. Tinha sucedido justamente ao Eric.
Quinze.
Não sou mau. Não sou bom. Os cães sabem o seu lugar.
“Se eu gritar, quem poderá ouvir-me, nas hierarquias dos anjos?” Rainer Marie Rilke
Recordo-me desde os verdes anos ser o espelho para mim um objecto
estranho onde por vezes me confrontava, raramente
me reconhecendo. Tudo começava
sempre com o encontro furtivo,
a fatalidade da pequena
pausa, meia dúzia de esgares, a pose séria por alguns segundos e o
abandono da imagem. Geralmente voltava
atrás. Procurava encontrar-me no que me via; queria abraçar aquele que me olhava como se fosse eu; mas era sempre um estranho que me voltava as costas e o que persistia era a consciência de que eu não existia como corpo, como carne. Mas agora era
obrigado a reconhecer aquilo que não podia deixar de ser. Era irónico e eu detesto a ironia.
Eu sou nada. O espelho
dizia-me tudo o que eu não queria ver. A culpa era defini-
tivamente esquecida. Eu sou nada e até a culpa me abandona. Nada. Ando às voltas num
hedonismo primário. No meu cérebro
não havia espaço para a moral. Tudo seria reclamado pelos oitenta quilos que diariamente me representavam.
Em frente à net eu continuava a adiar o futuro. Sempre
sem gritar. Sem espernear. Liguei
a televisão. Em Madrid estavam 23º às 15 horas, com céu limpo. Em Dublin 11, em Copenhaga 11 e em Atenas
30. Muito nublado,
neblina e limpo, respectivamente.
Tudo servia os meus propósitos. Não que isso fosse absolutamente essencial para mim. Eu era um indiferente por natureza. Acredito que ainda posso
voltar a sê-lo, mesmo depois
daquilo por que passei.
De outra forma, digo-o
agora, como teria
aguentado tudo aquilo? De qualquer forma, é difícil
ferirem-me de morte. As coisas têm a importância que têm. Dificilmente a importância que lhes atribuem.
Preocupo- me, de facto, mas com os meus pais; a mácula que caíra sobre mim não era minha,
posso garantir-vos, era deles e por isso me pesava tanto.
Não, não era minha. Eu tinha de livrar-me daquilo
por eles. Eu merecia-o, porventura. Eles não. De onde fala? O meu anjo da guarda está? Diga-lhe que o Andrés
telefonou, obrigado.
Estava farto da luz escura da casa. Da fuga que me afastava da vida. Como se
fosse um condenado. Farto. Sentia
falta do aborrecimento das ruas. Das pessoas que nada
tinham para me dizer. Do banal. Das coisas que me provocavam
o riso e só a mim. Estava farto de me esconder.
Nesses últimos dias tinha fechado
as persianas ao tempo e corrido os cortinados
para criar uma noite artificial interminável. Manipulei o tempo o quanto pude mas no
fim-de-semana, no sábado logo cedo, deixei-o entrar por todas as janelas.
Olhei-me uma última vez no espelho
e tomei a decisão adiada
e que tanto me custou tomar.
Peguei no caderno com as fotografias e os relatórios diários, fotocopiei-os, liguei
o fax e enviei-os
ao Pol. Provavelmente iria pensar que se tratava de
uma brincadeira; poderia discutir
com ele as possibilidades de um caso assim, sem expor o problema
como meu. Marquei o número de casa dele para evitar que a secretária
do consultório pusesse
as mãos nas fotografias e anotei na última página que não estaria em
casa durante todo o fim-de-semana. Depois, despime e fui tomar banho. Um banho
quente cura tudo. Quase tudo. Estava mesmo mal.
O CD deslizava
no Aiwa mas o som não me satisfazia. Procurei a cópia de vinil e
pu-la a rodar no Technics ligado à Sony e mudei os fios para o amplificador fabricado por medida por um amigo que era um “mãozinhas”. Há uns anos prometeu-me uma coisa de válvulas à maneira e poucas semanas depois bateu-me
à porta com um caixote onde eu pensei que trouxesse
um frigorífico. Explicou-me que aquilo era à base de
válvulas, não sei quantas, uma coisa
à antiga, artesanal, uma obra de arte do som.
Não sei, não percebo nada de electrónica, som ou acústica,
mas garanto-vos, era uma coisa à maneira, com a potência
exacta, nem mais nem menos, para quem quer ouvir Honegger. Um som mais humano. E era disso que eu precisava agora.
Estava mesmo mal.
Não como havia uma semana, mas estava
mesmo mal. Agora tudo assentara e a poeira cobria-me numa sentença que eu começava pensar seria para a eternidade. Mas não
era só eu. O ar destes tempos é demasiado leve. Estamos
no fim do século, no último ano do século que vai passar, e não há
muito de que possamos gabar-nos. As coisas são assim. Valem o que valem e pouco mais. "C’est l’air du temp”. Hanibal Canibal
Lecter disse-o num filme a uma moça simpática
e sabia do que estava a falar. Ele saberia
do que eu estou a falar.
Não, eu não podia deixar-me
adormecer pelo estado das almas que me cruzam todos os dias. Eu tinha de me obrigar
a pensar naquilo.
Tudo devia estar escrito numa lógica qualquer. Mesmo
que absurda. Talvez a lógica do crime e castigo com as nuances do Livro de Job, nunca
entendidas pela essência judaico-cristã. Talvez remontasse a um tempo anterior àquela noite. Algo que fiz de mal, uma conversa que ouvi e não devia ter ouvido; uma rua em que cortei à direita e recusei o passo à esquerda, um dia, talvez
há muitos anos.
Ou talvez a mão de Virgílio que eu larguei,
talvez naquela noite.
Eu tinha de me obrigar
a pensar naquilo.
Como nunca, agora,
29 anos, longe dos oitenta quilos, era de mim que se tratava. Eu era só.
Dezasseis.
Entre outras coisas, pensar naquilo
Depois do banho e de me encher de cereais
e sumo de frutas - pode parecer
absurdo, mas eu continuei a fazer uma alimentação rica, equilibrada e saudável, como se
tudo fosse voltar ao habitual na segunda-feira seguinte,
como se eu apenas tivesse de
estar em forma para os dias vindouros; como se rapadas as últimas esperanças do fundo das entranhas eu estivesse à espera que a qualquer
momento pudesse tudo voltar ao normal e eu devesse estar na minha melhor forma para enfrentar o mundo
-, como vos dizia, depois dos cereais e do sumo de frutas, fui sentar-me um pouco à
varanda. Os miúdos estavam outra vez a jogar à bola, ao sol, em tronco nu. Corpos informados, sem género e embranquecidos pelo Inverno. Brancos,
ainda sem estigma
ou pecado.
Estavam a jogar apenas com uma baliza e o guarda-redes tinha o antebraço esquerdo esfolado e com terra. Tinha
os olhos húmidos. Chorara pouco antes. O que não o impedia de cerrar os dentes e lançar-se de novo aos pés ágeis de outro miúdo
que conseguiu passar-lhe a bola por debaixo do corpo. Este jogava sem meias e tinha
sangue no tornozelo direito, da parte de dentro.
Mais acima, no joelho, via-se
uma cicatriz provavelmente feita há muitos meses, mesmo anos; esta prolongava-se ligeiramente para a direita numa crosta vermelho
escuro. “Claro, é o miúdo
que se aleijou há uns dias atrás, quando choveu.” Tinha tropeçado
na bola. Eu tinha de me obrigar a
reagir.
Entretanto, passou uma rapariga por eles e eles pararam.
Não por causa dela, mas porque ela decidiu atravessar o parque exactamente
pelo meio do campo de futebol.
Devia ter uns dezoito anos.
Vestia um tailleur amarelo
torrado tipo Chanel,
talvez Chanel, debruado
num amarelo mais escuro com alamares da mesma cor. Uma visão
aterradora para as dez da manhã que começava
numa bandolete castanha como os
cabelos, mas estes mais claros, e acabava nuns Bally Bellezza bordeaux em pele de veado virgem,
mais caros do que o meu salário como assistente
na universidade. Os collants com motivos, flores ou losangos
- os meus olhos não perceberam e o meu cérebro não se interessou -, completavam a fotografia. O jogo esteve parado até que a pequena burguesa
desapareceu por detrás de uma cabine telefónica.
Eles deixaram de
a ver. Eu não. Encaminha-se para a floresta. Vai devagar. Desce a longa avenida de ventos que rudemente começam a estilhaçar-me os ouvidos. Por um momento quis adivinhar o seu rosto.
Quando entrou na floresta, as árvores
dobraram-se à sua passagem penitenciando a reverência que os infantes
lhe negaram. Tudo se suspendeu, então, e eu voltei-me para a solidão que era a minha.
Eles deixaram de a ver. O jogo recomeçou. Tinha dezoito
anos. Eu nunca
me engano na idade das mulheres. O aspecto dela agradou-me tanto como aos miúdos,
mas a ideia de que ia ali uma fêmea deixou-me
inquieto, excitado. Subitamente,
absorvi a cena com um terno
sofrimento e uma solidão gélida abateu-se sobre
a paisagem. Uma mulher era coisa que eu não tinha há quase um mês, desde que saíra de casa de F. com a saliva dela no meu pénis. Oh! como tudo era diferente
com Isabel.
Curiosamente, a falta de amor físico,
o único que eu ainda conheço, foi coisa que não
voltei a considerar desde que, ao ver-me no espelho, tive os primeiros sobressaltos acerca do futuro. Apenas
agora, de forma
inesperada, o coração
se voltava a apertar-me dentro das calças. Os senhores devem imaginar como não há nada mais cruel do que isso para um homem impotente.
Que grande sorte me foi estendida pela mão de Isabel. Que alívio trouxe a sua existência àquela angústia ingénua que eu vivia pela manhã quando os meus olhos
se fixavam no tecto. Foi esta sensação que eu tive novamente quando contemplava
aquela ninfeta incompleta para o amor. A mesma impotência
da razão turvada pelos sentidos. A neurastenia dos dias solarengos. Voltei a provar a química dos poetas que
apenas eles, na sua imobilidade sentada, podem escrever. A mesma impotência que não era nova para mim, apenas assumia outra forma. Mas eu reagia.
Talvez Pol estivesse neste preciso momento a receber as coisas que lhe enviara. Eu queria, finalmente, a sua ajuda. A ninfeta chamara-me para a vida - poderia eu ouvi-la? - e o vento
estilhaçante era agora uma brisa que acariciava as minhas orquídeas
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