Nas sociedades modernas,
sobretudo nos países em que o sistema eleitoral é reconhecidamente livre, pelo
menos quanto à possibilidade de todos os cidadãos poderem exercer o seu direito
de voto, criou-se a convicção generalizada de que os cidadãos são livres. Essa
constatação não podia ser mais ilusória!
Se restringirmos o conceito de
liberdade à mera ausência da opressão, feita pela força das armas ou pela
imposição da cadeia, então podemos considerar essas sociedades livres. Sem
querer menosprezar a importância que a possibilidade de podermos expressar a
nossa opinião tem, sem estarmos perante a ameaça de sermos denunciados pelo
nosso irmão ou por aquele vizinho que se diz nosso amigo, esse é um conceito de
liberdade restritivo e castrador.
Para ser livre o homem tem de ter
a capacidade de se expressar sem quaisquer limitações ou constrangimentos. Ora
como pode uma pessoa sem formação expressar-se em liberdade plena, quando está
limitado pela exiguidade dos seus conhecimentos, que não lhe permitem expressar
a opinião na sua plenitude, pois mesmo sendo livre para a emitir, não está
habilitado para a equacionar? Mas desenganem-se aqueles que pensam que a
formação académica resolve o problema. Essa pode colmatar a falha resultante da
falta de conhecimento para equacionar a opinião, mas não liberta o ser humano
dos condicionalismos da educação e da cultura onde foi criado. Esses são os
ingredientes que, ao mesmo tempo que lhe formam o caráter, ou a falta dele, criam
limites à sua própria conceção de liberdade influenciando a sua opinião.
Então e os sonhos? Esses não são
completamente livres?
A nossa mente fabrica os sonhos,
quer estes sejam vividos a dormir ou
acordado, tendo em consideração o nosso conhecimento e as nossas experiências,
que estão mais uma vez influenciadas pelos condicionalismos educacionais e
culturais. Isto pode parecer-vos um absurdo e uma espécie de condenação do ser
humano à subserviência da cultura e da educação, no entanto, é bem mais real do
que normalmente o percecionamos.
Para demonstrar isso mesmo aos
mais céticos, gostava de vos convidar, a todos, a fazer uma viagem no tempo e a
constatar como a cultura e educação dominantes, na defesa da liberdade dos
princípios em que acreditavam, praticaram as maiores atrocidades e os mais
indignos ataques a essa mesma liberdade. Para isso basta recordar as guerras
levadas a cabo ao longo dos séculos, em nome da civilização, que nada mais
alcançaram que a destruição de outras civilizações, tão ou mais grandiosas que
a dominante. Podemos recordar o custo, em vidas e em conhecimento, que a
inquisição trouxe ao mundo ou que o holocausto da segunda guerra mundial trouxe
até às nossas portas.
Mas se não quisermos recorrer ao
conhecimento histórico, basta ligar a televisão e ver as guerras, supostamente
em defesa da liberdade, que neste momento aprisionam várias zonas do planeta,
sejam elas na faixa de Gaza, no Iraque, na Síria ou na Ucrânia. De um lado e do
outro das barricadas, defendem-se princípios, convicções e liberdades, todos
eles condicionados por uma aprendizagem e uma cultura que é supostamente livre,
mas que ignora o princípio mais importante da liberdade.
É que a liberdade de um ser humano só chega até ao ponto onde começa a do
outro, seja esse outro quem for!
A verdade é que, por mais puros,
verdadeiros e livres, que eu entenda serem os princípios que defendo, eles
passam de livres a usurpadores, no momento em que invadem o espaço de liberdade
do outro. Isto é verdade para todas a culturas, todas as raças, todas as
religiões e todos os níveis de conhecimento ou de capacidade económica.
O homem apenas atingirá a
verdadeira liberdade quando perceber esta realidade, a interiorizar e a colocar
em prática, em todos os momentos da sua vida e com todas as pessoas com quem se
relaciona. Esteja em casa, na escola, no emprego, na rua, ou mesmo quando se
encontra apenas consigo próprio.
Falo da liberdade entendida com
respeito pela dignidade do ser humano, em todas as suas dimensões. Isso sim.
Isso é Liberdade!
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