A JORNALISTA | PARTE VII | CAPÍTULO 1 – Geneve
Perestrelo tinha recuperado de forma extraordinária nos últimos
dois dias. As análises e exames demonstravam que a pneumonia estava curada e
teve autorização para fazer a vida normal, embora com algum cuidado para não se
constipar. A passadeira tinha contribuído de forma relevante para a cura.
Mónica queria que ele voltasse à investigação, mas ele queria saborear a vida e
passou o dia a passear por Lisboa. Sentia-se livre e leve. «É estranho como
apreciamos mais a vida e a saúde depois de passar pela experiência de ficar,
ainda que temporariamente, sem ela.» Pensou. Talvez fosse também o momento de
tomar algumas decisões que tinha andado a evitar. A vida era para ser vivida e
não adiada! Pegou no telefone e convidou Mónica para jantar. A noite foi
maravilhosa e ficaram a falar até tarde. Quando se separaram nenhum dos dois
queria ficar pela conversa, mas Perestrelo resistiu. Era melhor ter a certeza
que ambos queriam o mesmo. Deixou a Mónica em casa e despediu-se com um beijo
no rosto. Mónica estava simultaneamente feliz e desiludida. Tinha a certeza que
ele gostava dela tanto como ela dele, pelo que o recuo a intrigou. Encolheu os
ombros. Tinha que lhe dar algum tempo.
Os gritos de Maria Eduarda lançaram o alerta. O agente de
plantão entrou em casa de arma em riste, mas não encontrou o ladrão. Estava
tudo trancado e não havia sinais de entrada forçada. Ele olhou para a mulher, em
estado de histeria e foi assaltado pela dúvida. Não existia qualquer evidência
da invasão. Era apenas a palavra dela. Para acalmar a mulher o agente ficou o
resto da noite no interior da residência. No dia seguinte, o incidente foi
comunicado à judiciária e Mónica foi até ao local, acompanhada de Perestrelo. A
casa já tinha sido passada a pente fino e não existia vestígios da presença de
algum ladrão. Perestrelo passou em revista as portas e as janelas antes de
falarem com Maria Eduarda. A viúva de Jair de Lins narrou, com todos os
detalhes, o assalto da noite anterior.
«A que documentos é que o homem se estava a referir?» Perguntou
Mónica.
«Não sei.»
Perestrelo olhou para ela de forma incisiva. Não conseguia
decidir-se. Pareceu-lhe identificar uma indecisão na voz dela. Algo quase
impercetível. Ela desviou o olhar evitando-o. Maria Eduarda estava a mentir.
«Para seu próprio bem, é muito importante que nos diga toda a
verdade, pois só assim a polícia pode protegê-la.» Disse Perestrelo.
Mónica olhou-o interrogadoramente, mas ele ignorou-a. Maria
Eduarda manteve a sua versão e Perestrelo perdeu o interesse na conversa. Havia
algo mais importante que tinha de verificar. Foi até ao exterior e inspecionou
a parede da casa e o jardim. Parecia tudo em ordem. No entanto, o olhar
experiente dele detetou que a parede tinha sido escalada. Seguiu o rasto pelo
jardim e no muro que separava as duas moradias. O assaltante tinha entrado por
ali. Tinha fotografado os sinais à medida que os descobriu pelo que estava em
condições de documentar a sua teoria.
Mónica concordou com ele, mas a investigação da cena do crime
não era da sua responsabilidade. Perestrelo fez o seu relatório e partilhou-o
com a polícia tal como estava acordado. O problema foi resolvido com o reforço
da segurança de Maria Eduarda.
«Eu acho que ela está a esconder alguma coisa.» Comentou Perestrelo.
«O delegado do ministério público acha que a tua suspeição não
passa de uma teoria da conspiração.»
«Talvez seja. No entanto, eu acho que deves vigiar os movimentos
dela.» Disse Perestrelo.
«Não temos meios para a seguir para todo o lado, sobretudo se
ela for para o estrangeiro.» Disse Mónica.
«Eu vou segui-la, mas se pudesses colocá-la sob vigilância essa
tarefa ficaria mais fácil.»
Perestrelo rapidamente se apercebeu que Maria Eduarda não era
seguida por outras pessoas. A Judiciária encarregou-se de as afastar. O
afastamento era temporário, mas servia os interesses da investigação. Maria
Eduarda foi informada que tinham sido presas as pessoas que a seguiam, estando,
portanto livre para se movimentar sem riscos. Nesse mesmo dia ela marcou o voo
para Geneve. A fila de passageiros que aguardavam a inspeção das malas era
longa, felizmente ela tinha comprado a opção fast track. Ao despir o
casaco a bolsa caiu ao chão e o conteúdo espalhou-se pelo chão. O senhor que
estava atrás dela largou tudo e ajudou-a. Tinha-o ouvido falar ao telefone um
inglês perfeito, o que significava que era estrangeiro. Sorriu.
«Thank you.»
«Não tem de quê.» Respondeu o senhor.
«O seu português é tão perfeito quanto o inglês. Isso deixa-me
indecisa sobre a sua nacionalidade.»
«Faço a minha vida entre os dois países, mas sou português.»
«Maria Eduarda.» Disse ela estendendo a mão.
«Muito gosto. Jaime Fonseca.»
Quis o destino que fossem sentados um ao lado do outro pelo que
aproveitaram a viagem para se conhecerem. Ela estava encantada com aquele
professor universitário, que fazia a sua vida académica em Oxford. Apenas os
cabelos brancos denunciavam a idade que tinha. A energia e a boa forma física
eram as de um homem de quarenta e não de cinquenta e cinco. Não se importaria
de o conhecer melhor. Ela contou-lhe que ia levantar uma encomenda que estava
num cofre, num banco, de Genebra e que regressaria de imediato a Lisboa.
«Eu vou ficar por Geneve uma semana, mas quando regressar a
Lisboa gostava de a ver, se estiver de acordo.» Disse Jaime.
Maria Eduarda ficou entusiasmada. Tinha gostado daquele homem e
embora ele fosse mais velho, a sua companhia era muito agradável. Já no fim da
viagem trocaram contactos e separaram-se. Maria Eduarda, apanhou o táxi para o
banco. O procedimento de identificação foi rápido e, finalmente, encontrou-se
sozinha perante o cofre. Era maior do que tinha imaginado. Lá dentro estava uma
mala fechada. Tentou abri-la, mas para isso era necessário um código. Não tinha
importância quando chegasse a Lisboa arranjaria forma de a abrir.
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