Avançar para o conteúdo principal

PALAVRAS SOLTAS - A despedida






A Despedida

Quando Patrick se aproximou da amurada do navio cruzeiro este já havia largado as amarras há algum tempo e seguia pachorrentamente, ao ritmo do rebocador, em direção ao mar. Ao fundo via-se a cidade de Lisboa em dois planos, com relevos distintos. No primeiro, estava a margem do rio onde as ondas esbarravam, tornando finito o seu movimento. Sobre a margem, uma barragem imponente de edifícios obstruía uma parte da vista de Lisboa, salientando-se de entre estes, pelo contraste criado, a mancha avermelhada, salpicada de linhas brancas, do Museu da Eletricidade, ladeada pela do Museu de Arte Arquitetura e Tecnologia, de tom claro. Ao fundo, num plano mais elevado, podia observar-se o velho casario de alguns bairros de Lisboa, tão típico com os seus telhados vermelhos, mesclado por alguns edifícios novos e encimado, à esquerda, pelos edifícios esguios que constituíam as Torres do Restelo, ao centro, pelo Palacete da Ajuda, de ar nobre e imponente e à direita, pelo Hospital da Cruz Vermelha, bordejado por uma mancha verde de arvoredo. Aqui e ali sobressaiam antenas da rádio e da televisão, que pela sua configuração pareciam elementos estranhos à paisagem. A simultaneidade da visão deste quadro com a partida conferiram ao momento uma nostalgia própria das despedidas de algo muito querido. Assim foi o adeus a Lisboa.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

O SEMÁFORO

O SEMÁFORO Na cidade do Porto, numa rua íngreme, como tantas outras, daquelas que parecem não ter fim, há-de encontrar-se um cruzamento de esquinas vincadas por serigrafias azuis, abertas sobre azulejos quadrados, encimadas por beirais negros de ardósias, que alinham, em escama, até ao cume e enfeitadas de peitoris de pedra, sobre os quais cai a guilhotina. Estreita e banal, sem razões para alguém perambular, esta rua, inaudita, é possuidora de um dispositivo extraordinário, mas conhecido de muito poucos: Um semáforo a pedal, que sobreviveu, ao contrário dos “primos”, tão em voga na década de sessenta, na América Latina. No início do século XX, o jovem engenheiro, François Mercier, de génio inventivo, mudou-se para o Porto. Apesar do fracasso em França e na capital, convenceu um autarca de que dispunha de um dispositivo elétrico e económico, bem capaz de regular o trânsito dos solípedes de carga, carroças, carros de bois a caleches, dos ilustres senhores. O autarca

CARTAS DE AMOR - AMOR IMPOSSÍVEL

CARTAS DE AMOR - AMOR IMPOSSÍVEL As palavras não me ocorrem perante a imensidão do sentimento que me invade o peito. Digo-te aquilo que adivinhas pois os meus olhos e os meus gestos não o conseguem esconder. Amo-te! Amo-te desde o primeiro dia em que entrei na empresa e tu me abriste a porta. Os nossos olhares cruzaram-se e, por instantes, olhamo-nos sem pestanejar. Senti que tinha encontrado a minha alma gémea. O meu coração acelerou quando me estendeste a mão e te apresentas-te. Apenas uma semana depois soube que eras casada. Chorei a noite toda. Não conseguia aceitar que não fosses livre para poder aceitar o meu amor e retribuí-lo como eu tanto desejava. Desde esse dia vivo em conflito: amo-te e por isso quero estar a teu lado, mas não suporto estar a teu lado, sem poder manifestar-te o meu amor. Quero fugir dessa empresa, não quero mais ver-te se não te posso ter, mas não consigo suportar a ideia de não te ver todos os dias. Tu és o sol que ilumina o meu dia, mas és

O BILHETE

O BILHETE Com os cadernos debaixo do braço ele subiu a escadaria do Liceu Camilo Castelo Branco, em Vila Real. Vivia numa aldeia próxima e tinha vindo a pé. Tinha vários irmãos e como estavam todos a estudar, tinham de poupar em tudo o que era humanamente possível. Já estava com saudades das aulas! Era irónico que tal fosse possível pois os jovens preferem as férias. Não era o seu caso. Tinha vindo de Angola e, por falta de documentos, tinha ficado um ano sem estudar, trabalhando na quinta, ao lado do pai, enquanto os irmãos iam para as aulas. Estudar era, portanto, a parte fácil. Procurou a sala onde a sua turma tinha aulas: Ala este, piso zero, sala seis. Filipe era um aluno acima da média, mas a sua atitude era de grande humildade: esperava sempre encontrar alguém melhor que ele. Dado que tinha ficado um ano afastado da escola estava com alguma expectativa em relação à sua adaptação, mas confiante nas suas capacidades. Não tardou em destacar-se e no fim do primeiro tri