JORNALISTA | PARTE III | CAPÍTULO 2 - Pânico na LTCBK
Jair de Lins tinha regressado do Luxemburgo fazia uma semana. A
contenção que tinha feito do seu pequeno deslize tinha sido satisfatória,
considerando que a razão da alteração do negócio tinha sido mantida em segredo.
O que ele não esperava era que os restantes sócios o viessem a questionar sobre
os motivos da alteração das condições. Alguém lhes tinha chamado à atenção para
o facto. Não podia ter sido a equipa interna porque essa tinha ficado
maravilhada com a performance dele. Só podia ter sido Cristine Spruit. O melhor
era aguardar. Os sócios tinham todos esqueletos no armário por isso evitavam
trazê-los para a luz do dia. Se alguém estava disposto a tal, isso era mau
sinal para a sobrevivência da sociedade. Na verdade, isso não o surpreendia
dadas as movimentações de bastidores que haviam começado logo após o
assassinato da jornalista. As reflexões foram interrompidas pelo toque do
telefone.
«Dr. Jair, tem o Sr. Kodiat ao telefone.»
De certa forma era uma
chamada inesperada. Estava à espera que tivesse sido outro o sócio a ligar-lhe.
«Vamos a isto!» Pensou.
«Olá Jair. Estou preocupado com o rumo que as coisas estão a
tomar.»
«Podes ser um pouco mais explícito?» Pediu Jair.
«Amanhã vão soltar os cachorros sobre ti.»
Jair ficou baralhado. Kodiat estava a ligar-lhe para o avisar.
Aquilo tinha água no bico.
«Porquê?»
«Por causa do que se passou na tua viagem ao Luxemburgo.»
«O negócio foi fantástico por isso não estou a ver qual é o
problema.»
«O problema não é o negócio, mas o teu passado.»
«Não entendo porquê. Isso não é propriamente uma novidade.»
«A novidade é que isso pode ser usado para prejudicar a empresa.
Aparentemente irá ser desencadeada uma investigação, do DIAP em Portugal e
outra da CSSF no Luxemburgo, com base numa denúncia sobre o teu passado.»
Jair ficou calado. Tinha que se preparar para o que vinha por
aí. Algum dos sócios queria tomar o poder na sociedade e não olhavam a meios
para tal.
«Desconheço essas investigações e tenho algumas dúvidas sobre a
veracidade da informação. Isto cheira-me a um golpe palaciano para dar a
liderança da empresa a outro acionista.»
Kodiat já suspeitava de algo do género. O seu telefonema a Lins
era exatamente para obter a informação sobre a veracidade das investigações.
«A existência dos processos e o facto do negócio do Luxemburgo
ter estado em causa devido ao teu passado vão ser discutidos. Eu não estou
interessado em nenhuma mudança por isso espero que te defendas e não me dês
motivos para votar a tua destituição.»
Jair contou as armas. Precisava de mais um aliado. Raj Badour
não estava interessado na gestão da sociedade por isso o seu adversário devia
se um dos outros dois. A grande questão era
saber de que lado ficaria o Indiano. Estava na altura de fazer uso do seu
trunfo. Ele não se podia dar ao luxo de perder a liderança da empresa.
A sua vida era um turbilhão: a mulher queria separar-se, a
amante queria emancipar-se, a empresa queria despedi-lo e ele queria continuar
a ter tudo o que sempre tivera. Poder e mulheres, mais propriamente sexo, eram
a sua droga, simultaneamente uma fonte de energia e de dependência!
Graças ao seu aliado, ele partia com trinta por cento dos votos.
Isso era uma vantagem porque o Brasileiro só tinha quinze. No entanto, para a
estratégia resultar ele tinha de obter o apoio dos dois sócios maioritários.
Isso só seria possível se conseguisse descredibilizar Jair de Lins. A denúncia
levaria ao afastamento do seu adversário, mas as consequências de uma
investigação, caso não fosse controlada, poderiam ser devastadoras. Em qualquer
dos casos o esquema tinha sido bem urdido e desde que ninguém desconfiasse que
ele tinha sido o diletante, estaria no lado seguro da equação. Optou por enviar
informação sobre uma operação que não tivesse problemas, mas cuja complexidade
permitia ajuizar a atuação de Lins de forma duvidosa.
O cerco apertava e ele precisava de alcançar uma posição que lhe
desse alguma proteção em Portugal. O país era cada vez mais a plataforma do seu
negócio. As mercadorias entravam e saiam com facilidade que era o que convinha
no seu ramo de atividade.
A reunião parecia um jogo de póquer. Scott Taylor mostrou o seu
jogo. Tinha uma procuração de Li Cheng para votar a destituição de Jair de
Lins. Os fundamentos dessa destituição residiam no efeito negativo, para a
sociedade, da atividade particular, atual e passada. Eram argumentos de peso e
os acionistas maioritários voltaram-se para Jair. Caso não conseguisse defender
a sua posição sabia o que lhe aconteceria. Primeiro demonstrou que os processos
de investigação não teriam impacto negativo na sociedade pois não encontrariam
nada de ilegal ou mesmo irregular. No entanto, realçou que a exposição da
sociedade seria prejudicial. Scott cavalgou a onda não querendo acreditar que o
sócio lhe tinha proporcionado tamanha boleia. Exagerou. Questionou mesmo a
capacidade da empresa em guardar os seus segredos e o ambiente criado pela
gestão, que levavam à prática da denúncia.
Nessa altura Jair de Lins colocou sobre a mesa provas de que a
denúncia tinha sido feita pelo sócio como forma de ganhar uma vantagem sobre
ele. No ar deixou uma interrogação:
«É este o tipo de CEO que vocês querem? Aquele que não hesita em
colocar em risco a nossa empresa com
o único objetivo de se promover?»
Scott não tinha antecipado aquele desfecho. Tinha sofrido uma
derrota pesada, mas não iria desistir. O que ele não esperava era que os
restantes sócios se propusessem exercer a opção de compra das suas ações. O
parassocial era claro: ele tinha de vender. Incrédulo, ele constatava que acabava
de ser expulso da sociedade e nada podia fazer quanto a isso.
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