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A JORNALISTA | PARTE III | CAPÍTULO 9

A JORNALISTA | PARTE III | CAPÍTULO 9 – O Transporte

A noite, entretanto, tinha caído e não era fácil encontrar o camião das armas, na escuridão. Os homens dos GOE entraram nos helicópteros e começou a caça ao homem. A pesquisa foi feita em círculos tomando como epicentro o local onde se tinha dado o confronto. Assumindo que o americano tinha partido daí para ir ao encontro do camião. Mónica Fonseca dispensou a maioria dos homens e acampou no local, acompanhada de três dos seus homens. Tinham que esperar pela equipa forense. Dada a gravidade dos confrontos, os GOE deixaram quatro homens a proteger o local, estrategicamente posicionados.
Mónica depois de revistar os homens todos começou a passar as carrinhas, ou o que restava destas, a pente fino. Tudo o que pudesse encontrar e a ajudasse a concluir a sua investigação seria bem-vindo. Para além disso era importante encontrar uma pista que ajudasse a encontrar o camião, pois este transportava uma carga que não podia sair do país: entre as armas encontravam-se misseis, armas sofisticadas e agentes biológicos que, se usadas por terroristas, poderiam ter um impacto devastador.
Scott estava de muito mau humor. Tinha corrido tudo mal. Se aquele carregamento não chegasse ao destino ele seria um homem morto. Dificilmente conseguiria repor o valor do mesmo e ainda que o fizesse tinha dúvidas que o deixassem viver. Os homens com que lidava não brincavam com os negócios e, normalmente, os erros pagavam-se com a vida. Meteu a mão no bolso para tirar a guia de transporte do camião que seguia à sua frente e ficou gelado. Tinha perdido o documento. Não precisava dele para nada, mas isso significava que alguém o podia encontrar e identificar o camião onde seguiam os contentores com as armas. Pararam na bomba de gasolina e ele colocou todos os homens no camião.
«Eu vou à frente para tratar de tudo. Preciso que faças com que o camião chegue a Setúbal.» Disse para ao chefe dos mercenários.
«Algum problema que justifique a alteração do porto de embarque?»
«Estou apenas a ser cauteloso. Depois de tudo o que aconteceu esta noite acho melhor utilizarmos o porto alternativo.»
«De acordo. Não te preocupes. Ninguém conhece a carga que levamos. Não vamos ter problemas.»
«Mantém-te fora da autoestrada.»
Apesar da tranquilidade das palavras a tensão era visível. Scott nem dessa tranquilidade comungava, mas não podia partilhar esse sentimento com o operacional. Partiu e deixou o carregamento a cargo dos seus homens. Quando ficou sozinho informou os clientes da situação e seguiu para Setúbal. Esperaria à entrada da cidade. Se tudo corresse bem ele estaria lá para colher os louros caso contrário não seria apanhado com as armas.
Ao fim de duas horas de buscas não tinham encontrado nenhuma pista sobre a identificação do camião. Foram colocadas barricadas em todas as saídas da autoestrada e à entrada de Sines. Vivia-se um ambiente de apreensão, estando toda a gente com os nervos à flor da pele. Nenhum camião passava sem ser devidamente revistado. A verdade é que, à medida que o tempo passava, a esperança de vir a encontrar algo diminuía. O mais provável era que o americano estivesse a usar um destino alternativo. Mónica não sabia o que responder aos pedidos de informação, insistentes, do capitão dos GOE. Ela não tinha nenhuma informação que o pudesse ajudar. Precisava de pensar. Afastou-se um pouco das carrinhas e embrenhou-se no pinhal que existia ali ao lado. «Deve ter sido por aqui que o americano fugiu.» Pensou. Como estava escuro usava uma lanterna para iluminar o caminho. À primeira vista ignorou o papel, mas depois de ter passado por ele o seu cérebro processou a informação: aquilo era uma guia de transporte. E se… voltou atrás apressadamente e recolheu o papel. Tratava-se de uma guia de transporte de quatro contentores para o porto de Sines. A informação sobre a matrícula do camião foi de imediato passada aos operacionais. Não devia ser difícil de identificar pois era um camião com dois atrelados.
A espera tornou-se desesperante e à medida que as buscas não produziam resultados a tensão foi aumentando. Na autoestrada e, percorrida uma distância razoável, não existia nenhum camião com atrelado duplo.
«Verifiquem na direção norte. O plano alternativo pode ser ir para norte.» Disse Mónica.
«Quem disse que eles tinham um plano alternativo?»
«Ninguém. Mas temos de assumir isso.»
Nada. O camião parecia ter-se evaporado! Mónica sugeriu que procurassem as estradas secundárias que levavam a Sines e a Setúbal. Esse era outro percurso viável para um plano alternativo. Foram encontrados dois camiões, circulando bastante separados um do outro, mas nenhum dos dois tinha a matrícula indicada na guia de transporte.
«A matrícula pode ter sido mudada. Sugiro que verifiquem os dois.» Disse Mónica.
Para evitar que o que circulava mais atrás percebesse alguma coisa, esse foi o primeiro a ser abordado. O aparato da intervenção foi grande e as consequências quase desastrosas. O condutor assustou-se com a aproximação dos helicópteros e quase se despistou. Faltou pouco para o camião se virar a abalroar alguns carros. Depois uma grande derrapagem e de ter rodado sobre si próprio, cento e oitenta gruas, o camião imobilizou-se A carga foi analisada e das armas nem sinal. Tinham abordado o camião errado. Isso significava que só podia ser o que seguia à frente.
Os homens viram os helicópteros aproximar-se e perceberam tudo. Abriram fogo sobre estes e aceleraram. A estrada estava vazia pelo que circulavam a uma velocidade muito acima do aconselhável. A curva que se apresentava, mesmo antes da ponte sobe uma pequena ribeira, era demasiado apertada. O condutor ainda tentou reduzir a velocidade, mas quando curvou à esquerda o camião entrou em descompensação. Os homens saltaram todos com a exceção do condutor que foi parar dentro da ribeira.
«O camião vai despistar-se. Existe a possibilidade dos agentes químicos se libertarem?» Perguntou o capitão ao chefe ao especialista com quem estava em contacto desde que iniciaram a aproximação ao camião.
«Depende da forma como estiverem acondicionados. Sugiro que mantenham a distância durante algum tempo.»
Os helicópteros ficaram a sobrevoar o espaço, num compasso de espera para ver se os agentes químicos haviam sido libertados com o acidente. Aparentemente isso não aconteceu. O grupo armado ainda resistiu aos primeiros tiros, mas os que não foram mortos com a resposta dos GOE renderam-se. Quando a situação ficou controlada fizeram a contagem: tinham dois mortos, três feridos e um homem completamente ileso. Trataram dos feridos e começaram a interrogar o ileso. O homem recusava-se a falar. No entanto, quando foi confrontado com o facto de enfrentar uma acusação de terrorismo, em função da carga que transportavam, ele mostrou-se mais colaborador. Foi assim que ficaram a saber que, no armazém que tinham alugado, estavam guardados mais dois carregamentos de armas.

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