A JORNALISTA | PARTE V | CAPÍTULO 3 – Barricado
A mulher desceu diretamente para o piso das salas de
conferências e misturou-se com eles, aproveitado o facto de muitos se irem render
ao vício da nicotina. Ainda bem que estava disfarçada pois cruzou-se com um
rosto que conhecia muito bem.
No exato momento em que ela saía para a rua, tranquilamente, o
empregado do room service fazia a
entrega da refeição solicitada, no quarto 1220. Quando chegou ao quarto
estranhou o facto da porta estar aberta. Por precaução bateu e chamou, sem que
tivesse obtido qualquer resposta. Alguém estava a tomar banho, pois o ruído do
chuveiro era perfeitamente audível. Provavelmente só existia um hóspede e
estando na casa de banho não o ia ouvir chamar, mas as regras impediam-no de entrar
sem o consentimento, dos hóspedes, desde que estes estivessem no quarto.
Decidiu espreitar lá para dentro. A porta da casa de banho estava aberta e a
água do chuveiro parecia correr sem que ninguém a utilizasse. O quarto parecia
vazio! Decidiu entrar… Apenas quando estava a meio do quarto é que viu o corpo,
estendido no chão. A visão da cabeça dentro duma poça de sangue arrancou-lhe um
grito da garganta, ao mesmo tempo que largava tudo e corria para o elevador. O
chefe da receção, um homem com larga experiência em lidar com situações
complicadas, levou o colega para a sua sala e lidou com o assunto sem levantar
ondas. Era importante não gerar o pânico entre os hóspedes.
A polícia foi alertada de imediato e a polícia judiciária foi
chamada a intervir. Mónica Fonseca recebeu um telefonema do chefe, informando-a
que o assassinato deveria ser tratado como um caso prioritário, pelo que se
dirigiu rapidamente para o local. Os agentes da polícia fizeram um compasso de
espera, pois não queriam tomar conta da ocorrência. Preferiam fazer apenas a
segurança do perímetro, deixando a judiciária tratar do resto.
Scott Taylor recebeu a notícia da absolvição do Chef Walker com
verdadeiro entusiasmo. Esperou que ele saísse em liberdade e segui-o, sempre
que pôde, mas sem correr riscos desnecessários. Fazia três dias que rondava o
hotel procurando uma oportunidade para entrar no mesmo sem ser notado. Naquela
manhã vislumbrou-a, misturando-se com o grupo de fumadores que frequentavam uma
das conferências. Acompanhou o grupo até à entrada da sala e depois dirigiu-se
para a casa de banho, separando-se dessa forma dos restantes. Para evitar
passar pelo lobby de entrada decidiu subir de escadas dos três primeiros
andares, o que fez com que a subida lhe tomasse mais tempo do que o previsto.
Isso não era uma preocupação: tempo era o que ele tinha de sobra, naquele
momento. Olhou para o relógio. Tinham passados vinte minutos desde que tinha
entrado no hotel. Chegado ao piso onde se situava o quarto do Chef Walker, apressou
o passo. Quando se aproximou do quarto achou estranho ver a porta meia aberta e
um carrinho do room service
abandonado, no meio do corredor. Tinha que atuar depressa. Espreitou para dentro
e o quarto pareceu-lhe vazio. Alguém estava a tomar banho. Entrou na casa de
banho com todas as cautelas. O chuveiro corria livremente, mas o espaço estava vazio. Intrigado voltou ao quarto. Nessa altura, ouviu as vozes em alvoroço no
fundo do corredor. O português dele não era exemplar mas dava para entender que
alguém dizia, a um inspetor da polícia, que o Chef Walker estava morto.
Dirigiu-se para a porta com intenção de fugir mas viu de imediato a inspetora
Mónica, que sacou a arma quando o viu. Recuou para dentro do quarto e
barricou-se. Desta vez ele não tinha escapatória. Não podia ficar ali pois, se
fosse preso, sabia o que o podia esperar. A única alternativa era abrir
passagem a tiro. Pegou nas duas pistolas, abriu a porta e saiu para o corredor
aos tiros. Obrigando os agentes da judiciária a recuar escondendo-se. Andava de
costas, o mais depressa que podia, mantendo os agentes contidos na sua linha de
fogo, com verdadeira mestria. Quando sentiu o frio do cano da arma encostado na
nuca estremeceu. Não tinha antecipado que a inspetora Mónica se pudesse ter
colocado do outro do corredor tão rapidamente. Só tinha uma hipótese, era
apostar na hesitação dela e reagir com rapidez. Rodou sobre si próprio,
levantando o braço direito para afastar a arma da sua cabeça, enquanto
procurava atingi-la com a pistola da mão esquerda. Mónica percebeu o que ele ia
fazer e rodou ligeiramente o seu corpo evitando o primeiro disparo, que a
tingiu apenas de raspão. Sem hesitar disparou um só tiro, que lhe trespassou as
têmporas e Scott Taylor caiu, redondo, no chão.
Mónica foi de imediato socorrida pelos colegas, protestando que
não era nada. Para os calar retirou do bolso um penso rápido, retangular e
tapou a ferida. Os colegas olharam-na boquiabertos, sem compreender a razão por
que trazia com ela aqueles pensos rápidos, mas não deixaram de reconhecer que
era uma decisão bem acertada. Dirigiram-se todos para o quarto e iniciaram os
procedimentos de processamento do local do crime. Algo lhe dizia que Scott não
fora o assassino e isso seria fácil de provar, por uma análise balística. Ligou
para o chefe e fez um relatório sucinto.
«Se estiver correta e o assassinato da advogada estiver ligado a
este caso, o mesmo já acumulou quatro mortos.» Disse Mónica.
«Vai tratar do ferimento que eu preciso de ti a cem por cento,
pois esta investigação acabou de ganhar uma outra dimensão.» Disse o chefe.
Definitivamente assim era. Naquele momento eles tinham entre mãos
a morte de quatro pessoas de várias nacionalidades. A pressão para se encontrar
o culpado ia ser enorme. Mónica deixou que a levassem na ambulância.
Aparentemente a ferida era mais profunda do que tinha percebido. Fechou os
olhos e reviu tudo o que sabia sobre aquele maldito caso. Em boa verdade era
muito pouco. Assumindo que as quatro mortes estavam todas ligadas, existia por
detrás delas uma trama, um mandante e um executor, que podiam ser a mesma
pessoa, que trabalhava na sombra e sobre o qual ela não tinha, absolutamente,
pista nenhuma.
«Bolas!» Explodiu.
Era o caso mais frustrante com que ela tinha lidado, em toda a
sua carreira. Para agravar a situação, existia um facto que tornava tudo ainda mais frustrante: O detetive Perestrelo, apesar de ser um detetive
privado, sabia mais daquele caso que ela. Tinha de arranjar forma de o trazer
para o seu lado. O duplo sentido da expressão fê-la sorrir. Com a mão direita
ajeitou os cabelos num gesto que pretendia afastar aqueles pensamentos.
Precisava de fazer algo para mudar o estado das coisas!
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