O BEIJO
O
teu coração secou! Diziam as amigas. Raquel sentia-se vazia. Ele tinha partido,
balbuciando algumas justificações sem sentido. Reteve apenas uma, arrancada a
ferros: a outra tinha dinheiro. Tinha sido trocada por uns euros! As amigas
diziam-lhe que ela era muito mais mulher e que a outra era dez reis de gente,
mas Raquel não quis saber. Doía-lhe demasiado e quando a ferida é muito
profunda devemos evitar mexer nela. Tinha procurado muitas formas de acabar com
a dor, mas nada a conseguia aplacar. Ela teimava em continuar aninhada no seu
peito. Tinha-se aconchegado ali e recusava-se a partir.
Amara-o
tanto que que se sentia incapaz de amar mais alguém. A verdade é que tinha
perdido a fé nos homens. As amigas tinham tentado tudo mas, estivesse onde
estivesse, os momentos de verdadeira distração eram fugazes. Rapidamente se
fechava sobre si e se isolava do mundo. Fazia mais de um ano que estava só o
que para uma jovem bonita, de trinta e dois anos, não era normal. A bebida, na
noite de fim de ano, fez aquilo que nada, nem ninguém, tinha conseguido.
Dançou, riu e divertiu-se com os amigos como nunca. A Raquel estava de volta.
O
dia seguinte demonstrou que assim não era: tinha voltado tudo ao mesmo.
Entusiasmada com o resultado da bebida foi sair no sábado seguinte e começou a
noite no bar da discoteca. O olhar cruzou-se com o do estranho. Respondeu com
um sorriso irónico ao seu interesse e ele virou a cara. Depois do terceiro
shot, foi dançar. Ao início afastou os homens que se aproximaram, mas quando
ele se apresentou à sua frente ela não reagiu.
Ele
segurou-lhe a mão e ela deixou-se ir como se fosse esse o seu destino. O beijo
surgiu do nada. Ao princípio foi apenas um toque suave nos lábios, depois ele
invadiu-a com a língua, explorando todos os recantos da sua intimidade. As
línguas envolveram-se numa dança guerreira que rapidamente se transformou num bailado
clássico. Cansadas repousaram, libertando o parceiro, para mais um aconchego
labial. Talvez ele não fosse o seu príncipe, mas ela despertou para a vida,
qual bela adormecida. Os sentimentos eram como cogumelos com as primeiras
chuvas outonais. Vibravam dentro dela. O prazer e a alegria substituíram a
indiferença. Ela estava viva!
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