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A JORNALISTA | PARTE II | CAPÍTULO 9



JORNALISTA | PARTE II | CAPÍTULO 9 – O Americano
A polícia chegou de forma repentina e silenciosa. No momento em que chegaram os homens tentavam abrir as portas do BMW.  Num instante tudo ficou resolvido. O detetive e a advogada apresentaram queixa contra os homens que declararam apenas querer falar com os dois.
«O detetive Norberto Perestrelo tem-me enviado mensagens de extorsão e eu apenas queria esclarecer as coisas.» Disse o americano.
Depois de ele ter apresentado os sms no telemóvel, que suportavam a alegada chantagem, a polícia ficou sem saber o que fazer. Anabela e Perestrelo mantiveram a sua queixa. O número de telefone de onde as mensagens tinham sido envidadas não pertencia a Perestrelo. Era óbvio que tudo não passava de um esquema. Eles não iam esquecer que um dos elementos do carro que agora não estava ali lhes tinha apontado uma arma. O assunto acabou por ser resolvido na esquadra da polícia. Perante a acusação de ameaça com arma o americano, para se ver livre, teve de dizer quem era o homem armado. Tratava-se de um segurança que fazia parte da sua escolta pessoal e que depois de identificado ficou livre. A prova era débil e a intenção declarada era de uma abordagem pacífica, tendo evoluído para algo menos ortodoxo perante a fuga do detetive e da advogada. Tudo acabou com o registo do incidente e uma mera admoestação.
Os vários grupos, quando saíram da esquadra, seguiram direções distintas. Perestrelo e a advogada foram os primeiros a sair. Ele ia deixá-la em casa. O americano e os seus homens saíram em seguida.
«Isto foi demasiado fácil. Mantenham os olhos abertos para o caso de sermos seguidos.» Disse o americano.
«Chef, não temos a informação que o detetive particular trouxe da austrália. Como vamos fazer para a obter?»
«Já coloquei alguém no encalço deles. Vamos fazer uma vigilância discreta.»
O grupo seguiu em direção ao hotel. Ainda havia muita coisa a fazer e a primeira era agir como se tudo tivesse terminado. A equipa da judiciária foi a última a sair. Mónica Fonseca já tinha arranjado uma equipa para seguir o americano por isso podia dar-se ao luxo de fingir que os ignorava. Para não ser muito ostensiva, na passagem da mensagem, ficou encostada ao carro a vê-los partir, como se estivesse prestes a tomar a decisão se devia ou não segui-los. Pouco depois deles terem partido ela entrou no carro e foi-se embora.
Scott Taylor não gostava de ser encurralado. Sentado na suite do hotel refletia sobre a forma de sair da situação em que tinha sido colocado. Apesar de terem perdido o rasto, durante dois dias ao detetive Perestrelo, na Austrália o seu sexto sentido estava correto. Ele tinha ido a Brisbane. Uma conversa causal com um dos professores da universidade confirmou isso mesmo. De imediato intuiu que ele tinha ido investigar o escândalo sexual que envolvera o Chef Walker e a morte das jovens que tinha sido inicialmente associada ao caso. Uma visita ao detetive de Brisbane também confirmou o facto. Pena que ele não tivesse memorizado a morada da advogada a quem tinha dado o vídeo. No entanto, o estado em que deixaram o homem era garantia de que dizia a verdade. Assim, dependia do detetive Perestrelo e da advogada para a obter. Ele detestava estar dependente de terceiros, mas a vida tinha-o ensinado que nessas situações compensava ser paciente. O toque do telefone interrompeu-lhe os pensamentos. Olhou para o aparelho e reconheceu o número. Levantou-se, endireitou as costas e atendeu.
«Sim.» Disse Scott.
«As notícias que me chegam de Portugal deixam-me preocupado. Espero que os teus problemas pessoais não coloquem em risco a nossa operação.» Disse a voz do outro lado, em tom autoritário e seco.
Scott sentiu um arrepio na espinha. Aquele tom de voz não era bom para a sua saúde.
«Não te preocupes está tudo sob controlo.» Disse num tom que aparentava mais calma do que aquela que sentia.
A voz do outro lado amenizou-se
«Isso significa que a operação pode prosseguir tal como estava acordado?»
«Nada precisa de ser alterado no nosso acordo. O negócio será concluído nos termos do mesmo e sem qualquer falha.» Respondeu Scott, com confiança.
Sentou-se na poltrona, em frente à escrivaninha e ligou o computador. Tinha de fazer alguma coisa em relação àquela dependência. Enquanto não cortasse aquele cordão umbilical estaria sempre sob pressão, colocando a sua vida e a da família em risco. Bateram à porta. O seu braço direito entrou no quarto. As notícias não eram boas. Ele gostava que o assunto tivesse ficado resolvido naquela noite para poder dedicar-se ao negócio de corpo e alma, mas o destino tinha outros planos. O detetive Perestrelo e a advogada estavam em casa dela, fazia três horas e pelo menos uma coisa era certa: essa noite eles não iriam visitar o inquilino da morada que tinham trazido da Austrália. Paciência!
«Diz aos homens que não abandonem a vigilância, mas têm de ser invisíveis. A judiciária também deve andar por lá.»
«Se anda por lá não sei, mas por aqui a sua presença já se tornou visível.» Disse o seu homem.
Scott limitou-se a assentir com a cabeça e o seu braço direito deixou-o só.
Mónica Fonseca estava intranquila. Sentia nas suas entranhas uma sensação estranha. Pressentia que algo estava para acontecer ou já tinha mesmo acontecido. Algo importante que ela desconhecia mas que poderia ser determinante para ao caso que investigava. Esse desconhecimento e incerteza tiravam-lhe o sono. Desperta, vigilava fazendo zapping.

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