AMOR ENDIABRADO
Depois de um
jantar com as minhas amigas acabei no bar sozinha. Apesar disso, sentia-me
completamente à vontade. Havia tantos anos que não tinha uma noite assim
que... Pelo canto do olho vi quando entraste no bar, com os teus amigos. A tua
imagem ficou de imediato gravada na minha mente. Os cochichos eram um sinal óbvio
de que falavam de mim. Um de vocês seria o eleito ou o convencido, que tentaria
conquistar-me e seguramente que havia uma aposta envolvida. Desejei intensamente que fosses tu. Fixei o
olhar no meu baileys e esperei. A tua voz quente soou mesmo junto ao meu ouvido.
A abordagem foi hilariante, mas eu já tinha decidido dar-te uma oportunidade. Disse
a mim própria que me ia divertir. Ia proporcionar-te uma noite de ilusão, pensando
que me tinhas seduzido. Mas era a mim que eu estava a enganar. Cada momento
daquela noite ficou gravado, não apenas na minha memória, mas também no meu
coração.
Ainda te
lembras dessa noite?
Percorremos Lisboa
como dois apaixonados. Mostrei-te alguns bares e tu deste-me a conhecer a madrugada
nas discotecas. Acabamos abraçados, a ver o nascer do sol, no terraço do meu prédio,
na alta de Lisboa. Convidei-te para um
café e tu aceitas-te. Quando passamos o limiar da porta da entrada os nossos
corpos colaram-se um ao outro, como que tomados de vida própria. Os nossos lábios
procuraram-se febris de desejo e devoraram-se. Primeiro em beijos curtos e
eletrizantes, depois entreabriram-se e deixaram que as nossas línguas se abraçassem,
digladiando-se para dar e receber prazer. As tuas mãos subiram pelo meu corpo e
eu senti que este se rendia. Nessa altura disse-te para parares. A tua expressão
de incompreensão e desilusão ficará gravada para sempre na minha memória. Nesse
momento tive a certeza de que afinal aquilo não era um jogo para ti. Podia ter
começado assim, mas algures, durante a noite, o teu interesse tornou-se genuíno.
Tu recuaste e disseste:
«Tinhas que
obter a rendição total. Uma vitória em toda a linha!»
«Desculpa não
entendi...»
Tu deste meia
volta e desapareceste. De nada adiantou eu chamar por ti, gritando o teu nome
na madrugada. Pensaste ser uma vítima do teu próprio jogo, quando eu apenas
estava a tentar não ser uma vítima dele. Apesar de estar convencida de que
tinha tomado a atitude certa não me perdoei por fazê-lo. Passei o resto do fim
de semana a pensar em ti e ao fim de uma semana tomei a decisão de escrever
esta carta. Não sei se posso classificar aquilo que sinto por ti como amor,
apenas sei que estar longe de ti me faz sofrer mais do que alguma vez pude
imaginar. Sinto uma pressão no peito que me sufoca, que sobe para a garganta e
me estrangula. Sinto necessidade da tua presença e saudade do teu toque. Quero-te.
Desejo-te. Desejo-te e satisfaço esse desejo, apenas para te desejar ainda
mais.
Quando fecho
os olhos sonho contigo. Nos meus sonhos tu és meu e eu sou tua. Entregamo-nos,
um ao outro, sem reservas nem pudor. Somos uno em corpos distintos. Felizes
amamo-nos como se não houvesse amanhã. A desilusão ao acordar dói muito mais do
que a felicidade experimentada no sonho, pois sei exatamente aquilo que perdi.
Espero que
leias esta carta, que percebas o quanto quero estar a teu lado. Quero que
possamos percorrer, em conjunto, o caminho da descoberta. O caminho que nos
permita identificar este sentimento que me queima o peito, na esperança de um dia
lhe poder chamar amor.
Helena
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