O HOTEL RURAL
Aos trinta e três anos Marta era mãe de três filhos e
casada há 12 anos. Considerava-se uma mulher feliz, mas nos últimos tempos
tinha sido invadida por uma inquietação que não sabia explicar. A consequência
mais comum dessa inquietação era a falta de paciência com o marido. Apesar dos
arrufos e das diferenças de opinião, no final do dia saldavam as contas,
enrolando-se entre os lençóis e fazendo jus à vontade de satisfazer o desejo.
Nessa noite ela não adormeceu logo. Faltava-lhe algo! Nos últimos três meses
tinha sido sempre assim. Aquilo começou a preocupá-la.
Levantou-se contra a vontade. O corpo pesava-lhe e
resistia às ordens da mente. Fazia algum tempo que não dormia bem e acordava
cansada. Olhou para o espelho e não
gostou do que viu. Os orifícios oculares pareciam duas sepulturas! Arranjou-se
e saiu. A música foi interrompida pelo soar da campainha. Tinha uma chamada.
«Olá João. Já estás
levantado?»
O João era um excelente colega e um bom trabalhador, mas,
normalmente, ninguém lhe punha a vista em cima antes das dez horas.
«Estou à tua espera. Não
te esqueceste que temos a inauguração.»
«Tinha-me esquecido! Não
te preocupes que estou a chegar…»
A empresa tinha
uma herdade no Alentejo, perto do mar onde estavam a desenvolver um projeto
imobiliário. Nesse dia era a inauguração de um pequeno hotel rural, que também
fazia parte do complexo. Eles chegaram por volta das dez ao local e foi cada um
para seu lado. Tinham funções e responsabilidades distintas. Marta foi
encontrar-se com os responsáveis pela organização do evento. Não podia falhar
nada, pois para além das chefias da empresa, iriam estar presentes muitas
individualidades. Ao dobrar uma esquina esbarrou num indivíduo e levantou a
cabeça preparada para explodir.
«Peço imensa desculpa.
Foi uma falta de atenção imperdoável da minha parte.» Disse o homem.
Marta ficou sem reação. Aquilo que lhe tirou as palavras
da boca não foi o pedido de desculpas, mas o charme do homem que tinha à sua
frente. Ela estava completamente rendida. Ele já tinha passado dos quarenta,
embora não aparentasse. Era alto e musculado, vestindo-se com grande aprumo.
Não se podia dizer que fosse um homem bonito, mas tinha um ar másculo e possuía
um magnetismo que a prendeu. Ela era uma mulher muito interessante. Alta,
elegante e com um rosto perfeito, que lhe conferia uma beleza recatada. Os
olhos verdes e o cabelo ruivo davam-lhe um ar exuberante que atraia e cativava
as pessoas. Foi o que aconteceu ao Cristiano.
Por coincidência ele era do dono da empresa que estava a
organizar o evento, por isso, foi com ele que ela passou o resto da manhã. Ao
fim de uma hora já existia uma cumplicidade entre eles como se fossem velhos
amigos. Mas quando, for força dos afazeres, se tocavam a corrente elétrica que
circulava entre eles dava para fazer arrancar o motor de um carro. Isso
deixava-os, simultaneamente, desconfortáveis e expectantes. Por volta do
meio-dia deram a tarefa por concluída. Estava tudo em ordem.
«Quer acompanhar-me na
revista aos quartos que vão ser visitados?»
Marta ficou surpreendida com ela própria e, quando viu a
surpresa estampada na cara dele, arrependeu-se de imediato do convite. «Meu
Deus! Eu não estou em mim. O que irá ele pensar?» Interrogou-se.
«Nada me daria mais prazer!» Respondeu ele, com um
sorriso que lhe iluminou o rosto.
Subiram e passaram em revista os quatro quartos. Afinal
não tinha sido má ideia. Ele fez meia dúzia de sugestões que melhoraram bastante
o aspeto dos aposentos.
«Não vão visitar a suite principal?» Perguntou ele, ao ver
que tinha ficado de fora.
«Está com um problema na
casa de banho. Vou mostrar-lhe»
Como a porta estava fechada ela pegou na chave para a
abrir. Por qualquer razão não estava a conseguir fazê-lo.
«Deixe-me tentar.» Disse
ele, avançado.
Ela não teve tempo de retirar a mão e ele segurou a chave
por cima da mão dela. Sem perceber bem porquê ela não reagiu. Enquanto ele
abria a porta e gentilmente a empurrava para dentro do quarto. Ele fechou a
porta e trancou-a sem lhe largar a mão. O contacto era eletrizante! Cristiano
puxou-a para ele e beijou-a. Foi um beijo carinhoso. Um toque suave com os
lábios semiabertos. A descarga elétrica daquele beijo fê-los viajar. Perderam a
noção de tudo, menos da presença um do outro. Beijaram-se loucamente! Sem saber
como estavam os dois apenas com a peça de vestuário que protegia o último
reduto. Ele deitou-a na cama e, sem parar de a beijar, sentiu-lhe o corpo. O
contacto fazia-os estremecer. Gentilmente beijou-lhe os seios e desceu atá ao baixo-ventre.
Depois libertou-a do escudo que protegia a sua virtude e admirou-a. Marta
estremeceu de prazer ao ver o olhar de admiração dele e, soerguendo-se,
libertou-o da última peça de vestuário. O corpo torneado e a pele macia davam-
lhe um prazer tão grande, que ela não conseguia parar de o acariciar. Nus,
rebolaram pela cama e satisfizeram o desejo que os consumia. Continuaram a beijara-se
e a acariciar-se, até atingirem novo clímax. Satisfeito o desejo, o ambiente
ficou um pouco estranho. Lavaram-se rapidamente e saíram do quarto seguindo
caminhos distintos.
Marta só lhe apetecia chorar. Sentou-se para almoçar com
os colegas mas a comida não descia. Levantou-se para passar água no rosto. O
andar era arrastado, como se carregasse o mundo às costas, tal era o sentimento
de culpa. Chorou. Isso ajudou-a a libertar a tensão que sentia e permitiu-lhe
comer algo. Durante toda a inauguração e a viagem de regresso, não foi possível
arrancar-lhe mais que alguns monossílabos. O resto da tarde foi no escritório.
À medida que a hora de regressar a casa se aproximava o pesadelo aumentou. «Como
vou encarar o João depois daquilo que fiz?» Interrogava-se.
Era sexta-feira e João tinha uma surpresa para ela.
Quando o cumprimentou ela sentiu algo diferente.
«Tens andado muito
stressada. Organizei um programa a dois.» Disse ele.
«Quem ficam com as
crianças?»
«Fica a tua mãe. Ela estava
radiante por ter as miúdas lá e elas adoraram a ideia.»
A vista sobre a cidade, proporcionada pelo restaurante,
era fabulosa e o ambiente estava decorado especialmente para eles. João era um
homem romântico e ela estava a precisar disso. Depois foram ouvir fados. Era
uma noite à medida dela. Marta segurou a mão do João e ele retribuiu-lhe com um
beijo. Foi um beijo quente e apaixonado, ao qual era correspondeu com ardor. O
beijo transportou-os para o mundo deles. O fadista continuava a cantar, mas
para eles era apenas um som de fundo: soava lá longe, muito longe... O resto da
noite foi de paixão e prazer. Fazia muito tempo que Marta não se sentia assim
com o marido. O sábado também foi só para eles. Parecia que estavam de lua-de-mel.
«Não sei se o mérito foi
meu, mas este fim-de-semana senti como que se tivesses voltado para mim, depois
de alguns meses de ausência.» Disse ele, ao pequeno-almoço, no domingo.
Ela não disse nada. Levantou-se e beijou-o com os olhos a
brilhar de paixão e depois continuaram a refeição. Arrumaram a cozinha, num
ambiente edílico e acabaram na cama novamente.
«Temos que nos
despachar. A tua mãe está à nossa espera para almoçar.» Disse João.
«Apetecia-me tanto ficar
aqui enrolada em ti!» Disse ela.
Ele abraçou-a e sorriu. Estava verdadeiramente feliz!
A mãe era a sua confidente e quando eles chegaram
percebeu logo que a filha estava diferente. Tinha voltado a ter aquele olhar
apaixonado dos primeiros anos de casada. A seguir ao almoço João foi conversar
com o sogro, enquanto Marta falava com a mãe.
«Fico contente que
tenhas ultrapassado o desconforto que sentias. O João é um homem maravilhoso e
ama-te verdadeiramente.»
«Eu sei mãe. Tu não
fazes ideia da forma com isto se resolveu.»
Marta contou tudo à mãe. Ela olhava para a filha
abismada. Nunca lhe tinha passado pela cabeça que ela fosse capaz daquilo. O
seu juízo era terrível, mas era sua filha!
«Espero que tenhas
aprendido a lição e que esse homem não te venha a trazer problemas.»
«Eu também mãe. Hoje
percebo que tudo não passava de minhocas no meu sótão. Eu amo o João e não
quero perdê-lo.»
«O que fizeste é muito
errado. É imperdoável! Neste caso, parece que te ajudou, mas olha que esse não
é o resultado normal da infidelidade.»
Marta acenou com a cabeça e os olhos encheram-se de
lágrimas. A mão abraçou-a e chorou com ela. Eram lágrimas de arrependimento e
felicidade, mas também lágrimas de amor.
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